quinta-feira, 30 de outubro de 2014

Crônica em saudação à morte


“Nada é certo, exceto morrer depois de ter nascido e a impossibilidade de, enquanto se vive, escapar do destino” disse o jovem Crítias a seu amigo Sócrates. Podia Crítias perceber que o intervalo entre nascer e morrer é consequência direta da evolução? Não seria possível morrer no tempo da infinita divisão unicelular, naquele tempo egoísta nós auto-duplicávamos. Poucos bilhões de anos se passaram, e hoje comutamos para geração de únicos seres altamente adaptáveis. Deus, aquele humanóide vingativo do velho testamento não nos daria a adaptação comutativa sem nos retirar a vida eterna bacteriana. A complexidade celular deu origem ao programa de morte, fardo irrenunciável de cada ser vivo que aqui habita.

A morte, é o ultimo lançamento de Deus para o planeta terra que não caiu em obsolescência perceptiva ou tecnológica. Deus pode ter entristecido a muitos com sua nova invenção, a mim não. Imaginemos existir eternamente nesse arcabouço de atribuições todas criadas para vencer o tédio? A vida é um tédio.. O que nos a torna suportável, ou não, são as coisas que criamos para ludibriar a realidade tediante da existência. O amor, a guerra, o medo, as instituições, as filosofias, e tudo o que nos mantém ocupados são criações dos parceiros de Deus, os homens.

Parceiros irrenunciáveis de Deus, os homens resolveram legitimar essa criação de Deus. Criaram as religiões, intimamente ligadas a morte. Todas elas sustentam esse novo produto de Deus. Elas acompanham um manual de instrução de uso e manutenção, tipo palavras cruzadas, nada fácil. A linguagem é metafórica, que é pra dar emoção ás descobertas e os idosos ocuparem seu tempo. Ao final da leitura do Manual, todos sabem como ocuparem suas vidas e torna-las menos tediantes, no entanto em letras minúsculas no rodapé do canto esquerdo ao final do Manual, consta que a garantia de vida após a morte é restritiva, tudo depende do uso correto das instruções.

Entretanto, a arma indiscutivelmente mais eficiente criada pelos homens para dar significação a existência nesse intervalo finito, é o amor. Tão eficiente que ao homem não lhe é dado o direito de querer ou não. É espontâneo e pode causar danos irreparáveis na finitude do intervalo entre nascer e morrer. Um avanço sobre a religião. Nada submerso em amor é sacrifício. Seu poder alimenta as capacidades criativas do homem, ou pode destruí-la completamente. Tão forte, que alguns interrompem seu intervalo, adiantando o encontro com a nova tecnologia de Deus. Astutos homens, criam sobre suas próprias criações, inventam símbolos para o amor, imagens, cheiros, sons, letras... Sábio é que ultimamente essa invenção humana está a se tornar obsoleta.

Sábio Deus, quem é aquele sem seus correligionários? Quem é aquele se não querido em algum lugar qualquer que seja? Homem fiel a Deus, continuem criando, nos dê sempre o sabor da ocupação, do não ser em vão. Que a morte como produto manufaturado por Deus sirva aos homens, e sua pulsão de morte continue trazendo criatividade aos homens, para que fiquemos ocupados, o tempo todo.

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